O
CAMINHÃO FANTASMA
O
caminhão Chevrolet estava parado estacionado na velha garagem da
casa abandonada.Ninguém jamais ia la.A casa começava a se tornar um
verdadeiro viveiro de pulgas.O mato crescia alto, como numa espécie
de maldição, e o terreno era sempre o esconderijo provisório de
ladrões e assaltantes.Era como vudu o que, naquele entardecer,
estava para acontecer.Uma revoada de urubús, passou num vôo
rasante, pela rua enquanto a pequena cidadezinha se via pacatamente
sendo pouco a pouco engolida pelas sombras da noite.Naquela que era,
a área rural da cidade, um sapo atravessou a rua sem medo de morrer
atropelado, uma vez que, naquele fim de mundo, pela estrada de pó,
somente os trabalhadores que iam e vinham do trabalho nas plantações
de milho, os homens do subúrbio que iam passando poderiam pedir por
ajuda caso algo acontecesse.O caminhão Chevrolet que agora vivo,
jazia parado na garagem da casa, aquela noite, acendeu seus faróis,
sem ninguém ao volante, e manobrando perfeitamente para fora da casa
abandonada, se foi diabólicamente noite afora.Em Chapinhal era
meia-noite.A cidade agora dormia, num crepúsculo tão intenso, que
assustaria o próprio demônio.Mas não havia tempo para se viver.Na
delegacia da comarca de Chapinhal, os pms estavam de vigília. A
qualquer momento havia o risco de que acontecesse algum roubo ou
assassinato.Mesmo assim o território que fazia parte da área rural
da cidade quase não recebia nenhum chamado.A polícia, a não ser
por uma ou outra briga de bar, até então, não recebia nenhum
chamado.que poderia ser considerado de alguma importância.Chapinhal
se mostrava uma típica cidadezinha de estradas de pó e casebres de
madeira, uma típica cidade do interior, quieta e
pacífica.Macabramente, em uma rua qualquer daquela área da cidade,
o rabecão do IML ia indo pela estrada, como que prevendo a morte de
algum cidadão, que por alguma razao, viera a morrer, vítima da
assustadora mão da morte.De acordo com a lenda, numa noite, á muito
tempo atrás, ela veio levar o senhor Monsterscal embora para o
inferno, para comungar com aqueles que, em vida, cometeram os mais
variados tipos de crimes como estava escrito.E quis Deus que, aquela
noite, no bambuzal, o respeitável senhor desse cabo de sua vida, se
enforcando nos fundos da casa.Porquê ele veio a fazer isso, ninguém
sabe. Mas eles sabiam que esse mundo, ás vezes se mostra tão ou
mais selvagem, que a própria mente do professor, que na noite do
suicídio, estava guardando um segredo, tão ou mais macabro.que sua
própria morte.á muito tempo atrás. Um segredo que lhe custou a
própria vida.
O
rabecão do IML ia indo pela estrada, após mais um dia de trabalho
na cidade, para chegar ao fim da rua e ir embora, por não ter nenhum
caso a atender.Depois de um ridículo chamado de um pestinha, que
ligara dizendo que sua mãe tinha morrido. -Droga!-exclamou o
motorista do rabecão, depois da piada. - esses pestinhas não tem
mais o que fazer? -Calma - disse o papa-defunto, com um note-book em
seu colo, enquanto digitava o relatório daquela noite. - pense que,
ao menos, nós não vamos ter que despender o dinheiro da gasolina,
que gastamos vindo ate aqui.O IML que vá para o inferno. O
papa-defunto acabou de digitar, no relatório, que o chamado do
pestinha tinha sido um trote, para depois fechar o aparelho e
guardá-lo. Ele estava certo. O problema era do governo.Eles nada
tinham á ver com aquilo. Logo o automóvel atravessou a rua, indo
direto - rumo ao posto do IML.aonde eles entregariam mais um
relatório sobre a morte na cidadezinha. Uma grande piada - uma
simples piada. Uma palhaçada. Um comescó. Do topo do morro, ecoou o
distante uivo de um lobo, que estava tristemente uivando para a lua.O
motorista do rabecão e o papa-defuntos seguiam em silêncio, rua
abaixo, rumo ao morro do Hitchcock. aonde ficava o tenebroso posto do
IML, o Instituto Medico Legal. Na cidade era noite.Por hoje, as
atividades estavam encerradas. Ninguém pôde ver, quando um
caminhão Chevrolet D-60,cruzou a cidade, caçando o rabecão, para
em seguida, bater de frente contra o mesmo num grave acidente.
-CUIDADO!- gritou o papa-defunto ao motorista, tarde demais para
evitar o forte baque, que amassou o veículo num maquiavélico
acidente.que deixou o papa-defunto e o motorista em estado de coma,
.inconscientes, para o caminhão, depois com o capô completamente
amassado, desamassar a si mesmo, sozinho, manobrar e ir embora em
alta velocidade, como se nada nunca tivesse acontecido.
Mas
- o que realmente era aquele veículo? Um monstro, alguma espécie de
criatura? Para ter desamassado sozinho , após a batida,e ter fugido
naquela velocidade? Ninguém pôde ver, quando o caminhão se foi -
misteriosamente sozinho, sem ninguém no volante, naquela estranha
noite de desespero.na pacata cidadezinha. O que era aquilo? Obra de
Deus? Truque do diabo? Ninguém sabia. Era um mistério.
Desacordados, o motorista do rabecão e o papa-defuntos, que seguia
com ele, não haviam morrido, e recobraram os
sentidos
algumas horas depois do acidente. Após depoimentos, ambos afirmaram
que o caminhão Chevrolet havia colidido com o rabecão, na
contramão da estrada que dava para o morro do Hitchcock, no caminho
para o IML.onde iriam fechar tudo e ir para suas casas após mais um
dia de trabalho. Após o acidente, ambos foram liberados, e a polícia
acionada para o mais rápido possível, capturar o motorista do
caminhão, que sumira na noite em alta velocidade. - Foi terrível!-
exclamou o papa-defuntos sem escoriações após sair de alta do
hospital. - Esse louco deve ser
capturado
imediatamente! - As buscas seguiram pela noite afora, sem sucesso.
Quem estava no volante do caminhão? Ninguém sabia. Apesar das
varreduras da
central
de inteligência da polícia, nada ficou claro. Era um mistério
como, um veículo na
contramão
pudesse sair intacto de tal acidente. Após um impacto tão forte?
Apesar das buscas, nada foi encontrado. Logo, o caso foi arquivado,
apesar da polícia
continuar
no rastro do culpado.Enquanto isso, o caminhão Chevrolet, que havia
colidido
violentamente contra o rabecão, agora se encontrava estacionado na
mesma casa abandonada, cheia de ratos e escombros, como se nunca
tivesse saído de lá.Não havia ninguém lá. O caminhão jazia na
garagem, novamente intacto, como se nunca tivesse sofrido um único
arranhão.O culpado jamais seria encontrado. Simplesmente não havia
culpado.O
caminhão estava vivo.O sentimento ancestral do medo, vem pela
estrada de pó, de onde o rabecão vinha e pega o õnibus, um
fantasma, uma alma
penada,
que vive como uma assombração, que vaga pelo mundo, espalhando
através de suas criações, os duendes e gnomos que assombram o
mundo,
induzindo a humanidade a cometer atos de insanidade e os enchendo de
histórias enganosas e truculentas, levando-a a perpetrar loucuras e
a acreditar que existe um grande complô,contra ela, e que devido a
isso, algo que acreditam ser certo, deve ser feito, mesmo que esse
algo os leve ao assassinato, Mas aquilo no
caminhão
não era um fanático.Era o próprio mal em pessoa.A máquina, que um
dia fora
apenas
um engenho, criado pelo cérebro do homem, agora via-se, fio por
fio, vela por vela, peça por peça, dominado por forças
malígnas,
que um dia remeteram
ao
próprio diabo, nada mais do que mais uma das milhares de invenções
de Deus. assim como os seres humanos, nada mais do que criaturas
mundanas e frágeis, desprovidos de qualquer beleza, como formigas
que acham que podem tudo, e que se acham os reis de tudo.Uma máquina
possuída por uma força superior.
Era
assustador.Só restava uma pergunta - o
veículo
estava possuído, mas por que força? Ou pelo quê? Era uma boa
pergunta.
Na
TV, no canal da Igreja Mundial, o pastor Hamerman ria, após abençoar
uma mulher, que viera á Igreja para anunciar que seu poodle, havia
sarado depois de ter caído
doente.
-Aleluia!-exclamou
o povo em coro, para depois aplaudir a mulher da alta sociedade que
ria.Era ridículo.A manhã na vila Funny se mostrava quieta e
tranquíla. Pela
estrada
de pó,onde ficava o ponto do ônibus que cruzava o bairro, ia até a
área pobre da cidade e voltava, ia tudo bem.A
nuvem
de poeira da estrada de pó, cobria boa parte da rua, e o bairro
preguiçosamente se acordava para mais um dia.Havia pouca gente na
rua, e não havia grande barulho pelas redondezas. Apenas um rumor
distante - o ruído da
cidade.Ninguém
notou que o caminhão Chevrolet, que vinha vindo pela poeirenta
estrada,
naquele dia quente de verão, não era nada mais do que uma máquina,
e que
fantasmagóricamente,
rodava estrada afora, sozinho.Nada mais do que um momento de
atenção, uma olhada seria o
suficiente,
para ver que o velho caminhão Chevrolet, que seguia pela rua,
sozinho, era nada mais do que uma máquina - possuída
pelo
demônio - sem ninguém ao volante.
O
dia transcorreu sem problemas e eis que novamente era noite.Um vento
frio começou a soprar pela área rural da
cidade.O
caminhãao fantasma ia manobrando até estacionar na garagem da casa
abandonada, após ter cruzado a
cidade,
numa cavalgada de reconhecimento, mas o veículo não era uma
máquina, e sim, agora, uma espécie de
criatura,
que pensava e matava, um animal mudo e violento, que um dia fora, um
simples
caminhão Chevrolet, que criou vida, e que naquele dia de calor,
atropelara um cachorro poodle, e o devorara, com o capô
que
abria e fechava, como uma boca, metálica e cheia de presas, que um
dia fora a dianteira do veículo, e que agora, tendo sua fome
saciada, se encontrava curiosamente estacionada na garagem da casa
abandonada.E eis que naquela noite, o caminhão descansou, após ter
tido sua fome saciada com a carne de uma pequena criatura que serviu
para forrar seu
estômago.O
capô do caminhão, agora jazia molhado do pegajoso sangue e tripas
da
criatura
que um dia, fora, nada mais do que um bicho de estimação. O
caminhão comera o cachorro. Como explicar isso?
A
resposta era assustadora.
Para
não dizer nojenta...
Enquanto
isso, no canal Mercosul, num programa da Igreja Mundial, o pastor
Hamerman,
profetizava a palavra de Deus. ' tem gente que se rejubila, apenas
por ter olhos verdes por exemplo '. O pastor riu.'Outro dia um homem
veio até mim, dizendo que queria se filiar á igreja, Era um homem
de cabelo loiro, e olhos azuis.e sabe o que aconteceu? ' -
exclamava o pastor de mãos grandes, entroncado, para dar uma
risadinha. ' Uma de nossas testemunhas, uma moça de seus 24 anos,
toda
engomadinha, logo se abriu.E sabe o que ela disse?'Nossa, o senhor é
alemão , não?'. ' Sou.' respondeu ele.O pastor virou-se após um
instante, para exclamar - ' MAS EU NÃO SOU! ' - conclamou ele.- ' EU
SOU NEGRO!!!!!'. A multidão de fiéis calou-se. O
pastor
estava bravo.E exaltado.
'
E FOI ENTÃO QUE EU DISSE - A SENHORITA ESTÁ DESPEDIDA, PORQUÊ
ENTRE O CÉU E A TERRA SOMOS NÓS E O CARA LÁ DE
CIMA.ALELUIA!
'
O
programa que era transmitido aos quatro cantos do mundo, ecoava na
televisão da
casa
ao lado, da casa abandonada, em que jazia o Chevrolet d-60
estacionado.Seus faróis piscaram dando sinal de vida.Uma risada
fantasmagórica ecoou dos fundos
da
casa.O caminhão estava vivo.Era mais uma noite na cidadezinha.O
pastor Wawt colocou seu paletó e se despediu dos estúdios da rede
Conglomerado, após mais
um
dia de trabalho.-Por enquanto e só.- exclamou ele, se despedindo
enquanto
deixava
a capela. Era uma noite fria, e tudo o que ele queria era voltar para
casa. Mas, ao chegar no ponto do ônibus, foi pego de
surpresa
por algo que ele pôde discernir como um caminhão. Era o Chevrolet
d-60.
-
Ei, mas o que é isso? '-exclamou ele antes de ser atropelado.Não
havia mais ninguém na rua.O caminhão se foi, em alta
velocidade.
Era o caminhão fantasma.
-'Estamos
aqui hoje, para nos despedirmos do pastor Hamerman, que foi-se na
última
meia-noite,
desta para uma melhor. - exclamou o padre Smith, que presidia o
funeral, que era realizado na Great Chappel of our Lady of Ex Libris.
Foi quando em plena luz do dia, o vulto do caminhão fantasma,
passou rugindo o motor, em alta-velocidade.
-
É o caminhão fantasma! - exclamou o policial que fazia a ronda
naquela parte
da
cidade. - Vamos! - exclamou o outro pm ao volante da viatura. -
Atenção todos os carros, veículo em alta-velocidade se dirigindo
aos limites da cidade.Vamos
cercá-lo!
A
viatura saiu no encalço do caminhão Chevrolet, que fugia em
alta-velocidade. Era o caminhão fantasma, Num cerco histórico, o
veículo usado para assustar os
bandidos,
o apaziguador, o chamado Caveirão, foi posto no meio da rua, para
parar o caminhão-fantasma, que para lá
seguia,
em alta-velocidade.O caminhão ia a toda.Com a viatura policial em
seu encalço. E eis que aconteceu. Ia haver o impacto.
-Cuidado!-gritou o pm, mas era tarde
demais.O
caminhão fantasma colidiu com o Caveirão, num baque sem
precedentes.
-
Pode ligar o compactador, Mack! - bradou o
capataz
do ferro-velho municipal, com uma prancheta na mão.E o compactador
foi
ligado.Logo,
o velho Chevrolet, foi compactado sendo reduzido a nada mais do que
uma enorme carcaça de metal.
-
Bem, parece que está tudo acabado. - disse o capataz para seu colega
Mack, enquanto se retiravam do ferro velho, para depois irem
embora.Ninguém pôde ver, aquela noite, a carcaça do velho
caminhão, acender seus faróis, voltar á vida, se desamassando
sozinho,
para em seguida, manobrar para a rua, e voltar em alta-velocidade,
até a
garagem
da casa abandonada, onde
estacionaria,
de volta á seu esconderijo, onde ninguém morava, pronto para voltar
a sua vida fantasmagórica.Ia começar tudo de novo..
FIM
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